RELATO DE UMA HERANÇA


Solto a minha cansada mente
e deixo que me lembre
daquele tempo em que brincava
muito feliz, muito contente
por tudo e por nada.
Chegava a ser insensata.
Eram tempos de prata!
Fazia rir toda a gente,
ora imitando, ora dançando,
ora falando com as paredes,
minhas amigas que, pacientes,
mudas e surdas,
deixavam que lhes dissesse
tudo aquilo que eu quisesse.
“Amiga, a fruta estava caríssima,
e o mercado… cheio de gente!”
Aquele trajecto que a minha mente,
lesta, consente, estou recordando
e derramando gotas de sal,
porque a saudade faz muito mal!
Busco defesas. Recordo, em fila,
aqueles momentos, ano, após ano.
Seis filhos tive. Tive os que quis.
Daí em diante é pra esquecer.
Contudo, neste meu fado
que guardo, muda, houve episódios
de grande luz que iluminavam
a minha mente. Virei a página.
E aquela dor que a minha alma
ainda sente, muito pesada,
não vale nada. Foi a herança
que me deu força e tanta esperança.
Os meus bons filhos foram sarilhos,
muitos cadilhos, mas são tesouros.
Deles nasceram catorze netos,
e ainda uma menina
que brilha, como uma filha.
Ponto final! Eles são meus netos!
Com eles partilho grandes projectos
para o futuro que será deles.
Sim, que do meu… o que sei eu?!


Data da criação deste conteúdo:
2013-07-27