Maria Letra
Ao ler “Meus Caminhos de Cristal”, também eu acordei cicatrizes e deixei que elas me sangrassem – no embalo da escrita de Maria Letra. É impossível não nos comovermos perante a forma como a autora derrama as palavras!: de coração escancarado; transbordante de uma verdade sem máscara; com uma insatisfeita esperança (mesmo quando em desespero); sem receios de uma auto-exposição que nem toda a escrita autoriza, mas só a Arte permite.
Maria é muitas e uma só, ao longo destes “caminhos”! Muitas, nas temáticas que percorre, nos vocábulos com que joga e brinca, nas métricas em que dança e viaja. Muitas, também, nos universos em que se movimenta: ora marcadamente feminina na expressão do “ser Mulher”, ora mais “tradicionalmente masculina” quando “ousa” incursões políticas, ora ambos os géneros quando procura depurar o “ser EU”. Mas Maria Letra é só uma, una, no olhar acutilante para o MUNDO (interior e exterior), na forma destemida como enfrenta-sente-ajuíza a REALIDADE, no modo – por vezes absolutamente cru – como reflecte (sem moralismos mas moralmente sobre) a VIDA. Há, além disso, uma musicalidade rara na escrita de Maria Letra. Ao ler, apeteceu-me de imediato “ouvir” – ditos ou cantados – os poemas que tinha entre as mãos. Pelas imagens que invocam, pelo ritmo que lhes vem de dentro, pela rima que os enriquece e nunca os banaliza. Se ser poeta é “ser louco de amor por um pouco de sonhos”, então, sem nunca abdicar de Realismo e levando-nos com ela, Maria Letra atinge, nestes caminhos, uma cristalina loucura. Que outra coisa será a poesia?
Augusto Madureira \”Jornalista\”