Chocou-me profundamente ter tido conhecimento, já com 60 anos, de incongruências existentes entre a doutrina católica e o que possa o Estado do Vaticano ter tentado encobrir sob um manto diáfano de lamentável hipocrisia.
Recordo que, quando criança e quando adolescente, era o único membro da família que ia à missa ao domingo. O meu quarto – quando tinha treze anos – tinha uma mesinha carregada de santinhos e imagens. Meu Pai, que eu amava muito, era absolutamente ateu, e brincava sempre com essa minha prática semanal de ir à missa todos os domingos, tinha eu 15 anos. Quando me preparava para sair, ouvia-o sussurrar ao ouvido da minha Mãe, de forma a que eu ouvisse, e com ar entre irónico e brincalhão:
- A tua filha vai à missa ao domingo para pedir perdão a Deus e poder continuar a pecar durante a semana.
Claro está que o fazia brincando comigo, talvez porque acreditasse que tal prática pessoal iria passando com a idade... Não brincava, porém, quando me avisava que não ousasse confessar-me a um padre, porque aí o assunto seria mais sério... Mas eu confessei-me e fiz a comunhão em segredo, sem vestido especial ou qualquer tipo de festa, obviamente. Era um segredo que eu queria manter, porque sabia bem quanto me poderia custar se ele viesse a saber que eu havia transgredido as suas ordens.
Quando eu tinha já 18 anos, estávamos à mesa a almoçar e ele olhou para mim, com ar “ameaçador”, e disse-me:
- Que eu não tenha a confirmação de algo de que desconfio... porque aí, irei ter de tomar uma posição de que não irás gostar.
A partir dos meus 30 anos, mais ou menos, comecei a manifestar uma certa relutância em aceitar atitudes e posições da igreja, que me chocavam muito, mas embora tivesse deixado de ir à missa, eu continuava a considerar-me católica apostólica romana. Tive, porém, um conhecimento mais profundo de certas situações, durante os anos em que fiz deslocações permanentes a Itália, por questões de trabalho. Aí, fui confrontada com o conhecimento de certas notícias lamentáveis do que se passaria no Vaticano, e que nada tinham de comum com valores de humanidade e de fraternidade que eu tanto defendia.
Anos mais tarde fui viver para Torino, e foi aí que comecei a ouvir rumores da razão pela qual o Banco Ambrosiano tinha ido à falência e, então sim, comecei a duvidar dos conceitos de religião que tinha adquirido em criança e que fizeram de mim católica apostólica romana, bem contra o desejo do meu Pai. Assim sendo, fiz algumas reflexões! O Vaticano nada tinha que ver com os valores que eu defendia e, portanto, passei a perservar os que, moralmente me serviam, e servem, tendo-me desligado totalmente da igreja gerida por um grupo de entidades “religiosas” que estarão a degradar a confiança que os católicos depositavam neles.
No que diz respeito à minha posição actual, perante a igreja, perante a sociedade, e perante o mundo, faço a gerência entre o que se diz e o que convém respeitar, optando por seguir uma linha de AMOR incondicional à vida, e aos outros, carregada de tudo o que a minha consciência me vai ditando.