À DESCOBERTA DE ANCESTRAIS DESCONHECIDOS


Procurava uma mulher da praia, que vestisse como antigamente, de avental e lenço na cabeça. Só essas poderão responder às mil perguntas que tenho para lhes fazer. Tenho um interesse insaciável de saber tudo o que puder desta terra mágica, que nos prende a ela, inexoravelmente, para toda a vida. Só elas sabem tudo e conhecem todos... Queria falar com Mulheres da minha idade, aproximadamente, para que fossem capazes de perceber o que ansiava saber das muitas coisas que gravei na minha memória. Só elas serão capazes de falar-me dum passado que me pertence também. Mulheres com rugas, de pele morena queimada e dura como a coragem com que enfrentaram sempre o trabalho, de sol a sol. A maioria vendia peixe, que era transportado em cima do burro que as conduzia da Praia de Vieira de Leiria à Marinha Grande. Essas não podem compreender os jovens de hoje e falam com orgulho da sua coragem e dessa força com que procuravam vencer todos os dramas e todos os obstáculos. A alma delas parece gritar, quando relatam os tempos em que as suas Mães se arrastavam pela areia chorando e pedindo protecção aos seus santos, enquanto os maridos e/ou familiares iam para o mar pescar o peixe que elas iriam vender.

E encontrei! Falei hoje com Argentina Feteira, uma Mulher típica, marcada pela vida mas cheia de força na sua alma. E falou dos seus antepassados de tal modo entusiasmada e interessada em desvendar laços de família que eu fiquei receosa de não estar a perceber nada. Não queria maçá-la com perguntas, mas a sua explicação ultrapassava de tal modo os meus conhecimentos, que receei continuar a conversa e terminar chegando à conclusão de que eu era irmã de mim mesma ou até, sei lá, sobrinha da minha Avó ou filha dela. Era um novelo tal de familiares, que a minha mente ficou toda num sarilho. E dizia-me:

- A ‘nha Mãe, que Deus haja, fez de mim uma mulher às direitas. Passámos muitas dificuldades... mas éramos muito honestos. Tá a ver aquela porta pintada de verde? Era ali que o meu home me vinha namorar todos os dias. Que tempos! Olhe, o meu home é aquele que passou agora...

Mas falava-me de uma mistura de Tomés, de Feteiras e de Letras que me deixou muito confusa. Segundo esta Senhora, nós ainda somos primas, da parte dos Tomés, mas ela também tem Letras na família, pelo que percebi. Mas será que eu teria percebido mesmo?

O que terão estas pessoas de tão particular que são capazes de prender a minha atenção durante longas conversas? Guardam na alma a mesma magia que nos prende a esta terra. Não sou a única a afirmar que a Praia de Vieira de Leiria fica para sempre no coração de quem por aqui passa a sua juventude. Não direi o mesmo relativamente aos que vêm passar férias apenas, que não nasceram cá ou não são familiares de quem aqui nasceu. Esses não poderão nunca compreender a intensidade do sentimento que nos traz a esta praia... 

Parte de mim continuará aqui quando eu partir. Trata-se duma localidade a que pertencerei para sempre!


Data da criação deste conteúdo:
2014-09-29

Nota: Livros que recomendo:
Maré Alta de José Loureiro Botas
Os Avieiros de Alves Redol